Tarde chuvosa e cinzenta. Domingo. Novembro. Cidade do Porto.
Todas estas características conjugadas entre si são
convidativas para qualquer pessoa se resguardar no conforto do lar. Contudo,
neste dia decidi resistir a qualquer tentação e passear pelas ruas da cidade do
Porto.
Na verdade, estamos em 2011. Há 10 anos atrás, o Porto
recebia um dos maiores eventos culturais que a cidade jamais tinha assistido.
As ruas esburacadas com as obras de requalificação enfureciam os comerciantes
que viam dificultados os acessos às suas lojas pelo caos instalado. Os
portuenses em geral perdiam a paciência com os constantes atrasos dos projectos
mais simbólicos associados ao evento. Em abono da verdade, com toda razão, na
medida em que, por exemplo, a Casa da Música apenas foi inaugurada em 2005 e
que o Edifício Transparente tem hoje uma utilização deficitária. Por outro
lado, foi muito criticada a intervenção nos Jardins da Cordoaria, Praça da
Batalha ou Praça D. João IV. No entanto, passados 10 anos, a cidade do Porto já
não é mesma que recebeu a responsabilidade de ostentar o título de Capital
Europeia da Cultura. Estamos perante uma cidade diferente e, sem dúvida, melhor.
Mas voltemos então para aquela tarde chuvosa e cinzenta de
um domingo. É manifestamente aceite que Novembro é um dos piores meses para o
turismo na maior parte das cidades europeias. Na verdade, o verão já vai
distante e o Natal apenas no aquecimento. No fundo, tudo levaria a crer que uma
tarde com aquelas características no Porto fosse completamente despida de
pessoas e de movimento. Este seria, sem dúvida alguma, o cenário no ano de
2001. No entanto, estamos em 2011.
Ponto de mira: Cadeia da Relação. Um edifício carregado de
história onde Camilo de Castelo Branco escreveu o “Amor de Perdição” privado da sua liberdade e que alberga o Centro
Português de Fotografia. Foi aqui que iniciei o meu trajecto. A chuva intensa
convidava a uma visita demorada. Enquanto acompanhava a exposição temporária de
Marín, constatei que me encontrava rodeado de pessoas de diversas
nacionalidades que circulavam pelas várias salas da exposição.
Foi difícil ganhar coragem para sair da Cadeira da Relação
devido à chuva intensa, por isso esperei que acalmasse junto à porta enquanto
observava descontraidamente o Jardim da Cordoaria. Neste momento, reparei que
uma rapariga ruiva de olhos claros permanecia encostada à entrada do edifício
igualmente com o olhar perdido na chuva que caía com abundância. Não é
portuguesa, pensei logo. Deve estar à espera que a chuva acalme para poder
sair, especulei. Alguns minutos depois, a minha curiosidade foi satisfeita.
Chegou outra rapariga de cabelo preto e de tez pálida. Falaram em inglês com
sotaque. Eram evidentemente estudantes Erasmus de nacionalidades diferentes que
vivem no Porto e que combinaram usufruir da cidade, visitando a exposição no
Centro Português de Fotografia. Após cumprimentarem-se, entraram e fiquei
sozinho. Tinha chegado o momento para enfrentar a cidade chuvosa.
A decisão passou por descer a Rua dos Caldeireiros iniciando
o caminho até à zona da Ribeira. Os traços tradicionais das suas casas
cinzentas definem as características associadas ao Porto de cidade escura. Ao
longo da descida, cruzava-me com grupos de turistas de nacionalidade
estrangeira que procuravam descobrir todos os recantos da cidade. Alguns
espanhóis, outros sem dúvida ingleses. Mas muitos eram de nacionalidade difícil
de identificar. Eventualmente de países do leste da Europa.
O habitual percurso turístico da cidade acaba por desaguar sempre
na zona da Ribeira. Assim, em poucos minutos alcancei a Rua das Flores, o
Mercado Ferreira Borges e, por fim, o famoso “Cubo” da Ribeira. É aqui que o charme da cidade mostra todo o seu
encanto. Como a noite já tinha caído, as luzes da Serra do Pilar, da Ponte D.
Luís e de Vila Nova de Gaia pintavam uma tela que é difícil perder na nossa
memória. Grupos de turistas procuravam registar a imagem da cidade do Porto
espelhada no Rio Douro através da mira das objectivas. Uns portugueses, mas
vários estrangeiros. Um aglomerado de jovens bem junto do rio destacava-se de
forma evidente. Eram belgas, mas poderiam ser italianos, japoneses, alemães. Já
não ficamos surpreendidos com as pessoas que se cruzam pelo Porto.
Regressando da Ribeira, iniciei a subida da Rua dos
Clérigos. No entanto, era difícil concentrar-me nas linhas iluminadas da famosa
Torre devido ao som estridente das rodinhas das malas das dezenas de turistas
que desciam a mesma rua em direcção à Estação de metro dos Aliados. Neste
início de noite estava a acabar a aventura portuense para muitos. Provavelmente
o destino final seria a estação do aeroporto onde iriam apanhar um voo da
companhia aérea irlandesa Ryannair.
Nos últimos 10 anos, o Porto conquistou visitantes de todo o
mundo. O trio Ryannair, Metro & Erasmus mudou a cidade depois da Porto
2001. Actualmente, são milhares os jovens estrangeiros que escolheram a cidade
para viver por um ou dois semestres ao abrigo do Programa de Intercâmbio
universitário Erasmus. Por outro lado, muitos destes estudantes e demais turistas
ocasionais visitam o Porto a um preço acessível devido à proliferação das
companhias aéreas low cost,
nomeadamente a Ryannair, que operam no aeroporto Francisco Sá Carneiro. Por fim,
o metro permite aproximar as distâncias dentro da cidade.
Em 2001 nunca imaginaria passear um domingo à tarde pelo
Porto, cruzando-me com vários turistas e viajantes de outras nacionalidades com
mapa na mão. Em 2011, essa é uma realidade a que temos de nos habituar.
Recentemente, a Lonely Planet classificou a cidade do Porto como 4.º destino
mundial de acordo com o critério de Best
Value para 2012. Fica, assim, evidenciado que a cidade invicta continuará a
ser um destino de eleição nos próximos anos.
Desta forma, 10 anos depois não podemos ignorar que o Porto 2001
– Capital Europeia da Cultura criou uma cidade vintage. O Porto está definitivamente na moda!
Por Duarte Abrunhosa e Sousa
Por Duarte Abrunhosa e Sousa
Texto escrito no âmbito do curso de escrita de viagens, organizado por Filipe Morato Gomes em Novembro de 2011.